
Marcelo Kendji Murata recebendo o JMP em seu consultório ( Foto: Wesley Bischoff)
Segundo 7° relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio), elaborado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), só em 2013 foram realizadas mais de 52 mil fertilizações in vitro no Brasil.
O Jornal Matéria Prima entrevistou o ginecologista obstetra e especialista em reprodução humana. Marcelo Kendji Murata, 42, que atua na área há 17 anos e explica que decidiu trabalhar nesse meio com apenas 14 anos, após ler uma revista referente ao primeiro bebê de proveta do Brasil.
A partir de então direcionou-se para área da ginecologia e logo depois fez pós-graduação no Emory University Hospital, em Atlanta, nos Estados Unidos, além de outras especializações em Nova York e Washington.
Em entrevista ao JMP, Murata esclarece algumas dúvidas em relação aos tipos de tratamento existentes para casais que sofrem com a infertilidade, quais os meios acessíveis para quem não tem condições financeiras de fazer o tratamento e as leis que devem ser seguidas nesses tipos de procedimentos.
Hospitais vinculados ao SUS oferecem reprodução assistida de graça mas a fila é quilométrica
Quais os problemas mais comuns que causam a infertilidade feminina? E quais são os tipos de tratamentos existentes?
Quando a pensamos em infertilidade, muitas vezes está vinculado com a parte
do tratamento que não se resume exclusivamente à fertilização in vitro. Tem tratamentos clínicos cirúrgicos em que normalmente fazemos diagnósticos de doenças, como a endometriose, que é a maior causa de infertilidade na mulher. Ao mesmo tempo, já tratamos com medicações. A endometriose não tem cura, mas numa cura temporária a paciente consegue engravidar. Se todo esse processo não adiantar, partiremos então para as técnicas de reprodução assistida. Às vezes conseguimos fazer um tratamento clínico em cima disso e levar para a gravidez natural.
Com os avanços da medicina. Na área da reprodução humana, a idade deixará de ser um problema enfrentado por tantas mulheres?
Eu acredito que sim, porque podem vir a surgir outras técnicas que nós ainda não temos, mas conseguimos rejuvenescer o ovário da mulher injetando células-tronco, formando novos óvulos, e dar sobrevida reprodutiva maior para a mulher. Hoje pela lei do Conselho Federal de Medicina, a idade limite para tratamento na parte da infertilização é 50 anos, em outros países é 43. Agora, medicação para prolongar a fertilidade não existe. A mulher já nasce com um número pré-disposto de óvulos e com o passar da idade ela vai gastando a maioria desses óvulos. Quando chega numa faixa etária um pouco mais avançada, esse processo é natural e impossível evitar e melhorar. Recomendamos não ter essa espera muito longa para engravidar porque pode custar a vida reprodutiva da mulher.
O senhor acredita que uma FIV (Fertilização In Vitro) e uma inseminação artificial possa um dia se tornar de fácil acesso para as pessoas que necessitam recorrer a esse meio e ainda não têm condições?
No momento que surgiram as técnicas de reprodução assistida era realmente muito caro e até inviável, porque uma fertilização chegava a custar R$ 40, R$ 50 mil. Hoje deu uma queda no preço, em virtude de outros fabricantes terem material que utilizamos para fazer a fertilização. É uma área um pouquinho mais extensa de fabricantes que podem fornecer o material e quanto mais isso acontece, acho que tende a baratear mais, inclusive as medicações. Existem alguns Estados, São Paulo, Minas Gerais, e até no Paraná, em Curitiba, que existem hospitais vinculados ao SUS que oferecem reprodução assistida de graça e também as medicações, mas a fila é quilométrica. Acredito que um dia, se tiver incentivo do governo, isso pode, sim, baratear e se tornar vinculado com outros hospitais que venham a adotar essa política do SUS.
No caso das mulheres que vivem a dificuldade de ter filhos, é comum o senhor se deparar com problemas psicológicos?
Sim. É bastante comum porque o principal fator envolvido num tratamento de um casal que deseja ter filhos é a ansiedade. Muitas vezes, quando chegam ao consultório, provavelmente devem ter tentado um ou dois anos. Já chegam com a ansiedade de poder resolver o problema o mais rápido possível. Precisa de um amparo emocional, alguém que lhes passe confiança do tratamento que vai ser feito. Então acho que o fator psicológico hoje no tratamento do casal infértil, é o ponto crucial e o mais importante a ser visto e ser trabalhado também.
O senhor poderia falar um pouco sobre a ética e as regras que devem ser seguidas nesse meio?
Existem algumas leis que devem ser seguidas na área da reprodução humana, mas são relativamente novas. O primeiro bebê de proveta é de 1978, então, no Brasil tem leis que ainda vão surgir e que estão surgindo. A parte de transferências de embriões, antes era transferido cinco ou seis, hoje é pré-determinada . O número de embriões que devem ser transferidos até 35 anos, são dois; de 35 a 40; três e 40 em diante, quatro. Já na parte de doação de óvulos ou de gametas, deve ser seguida uma regra que [o doador] não pode ser remunerado para não virar um comércio, venda de óvulos ou de espermatozóides. E a ética na área de reprodução humana, eu acho que é a principal questão a ser levantada no processo, em virtude da confiança que a clínica vai ter em relação médico e ao paciente também.